quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Luiz Carlos, a muralha santarritense

O senhor é tido como um dos grandes goleiros da história de Santa Rita. O que leva um jogador de futebol a optar pela carreira de goleiro?

O goleiro é um cara que não joga em posição nenhuma. Mas é preciso ter dom, sorte e não ter medo.

O Bimbo foi goleiro?

O Bimbo foi um grande goleiro. Ele foi meu treinador, mas não cheguei a jogar com ele.

Por quanto tempo você jogou como goleiro?
Nos campeonatos de Santa Rita, eu comecei em 1963. Nesse ano eu ia ao campo e ficava esperando faltar goleiro para que eu pudesse jogar. Se algum goleiro falhasse então eu jogava. Sempre que surgia uma oportunidade eu estava lá. Com o tempo, me levaram para o Industrial (time local). O industrial foi o início de tudo aqui em Santa Rita. Antes, como não tinha televisão, os estádios enchiam. Então eu acabei dando sorte porque, naquela época, o Edson Marques era o presidente do time e tinha uma maneira diferente de trabalhar com futebol. Ele tinha uma postura de empresário. Ele aumentou e cercou o campo, levava bandas de música, fez uniformes para viagem, daí todos os clubes da cidade começaram a fazer o mesmo. Os times locais como Fluminense, Vasco, Flamengo (do Sr. Lucas) e o Minas Gerais, todos começaram a fechar seus campos e programar jogos para os finais de tarde. Com isso, o Sr. João Costa criou um campeonato profissional que deu origem à Liga Santa-ritense de futebol. Naquela época, o estádio era usado apenas para jogos oficiais. A gente não podia nem treinar nele. Foi uma época espetacular do futebol santarritense.

O senhor ficou quanto tempo sem tomar gol? Qual foi sua maior invencibilidade?

Eu não gostava muito de tomar gol, sabe? Então eu comecei a treinar para levar cada vez menos gols. Chegou um momento em que fiquei três campeonatos sem tomar um único gol e começaram a oferecer prêmios para quem conseguisse fazer um gol em mim. Aconteceu em uma época em eu já tinha encerrado minha carreira e meu amigo Samuelzinho falou: “Olha Luiz Carlos, eu queria que você jogasse no meu time”. Daí eu falei que já tinha encerrado e que não jogava mais futebol. Mas o Samuelzinho falou que estavam dizendo que, sem mim, ele não seria campeão e que era um sonho dele. Eu resolvi voltar. Arrumei novamente um treinador de goleiro e retornei. Eu disputei 3 campeonatos aqui em Santa Rita e um campeonato na Cachoeira. Nos quatro campeonatos juntos só tomamos um gol.
É verdade que o senhor recebeu um convite, na época do Pelé, para jogar pelo Santos?

Eu cheguei a jogar contra o Santos duas vezes quando atuava pelo time profissional do Pouso Alegre. O Pouso Alegre montou um time porque eles queriam subir para a primeira divisão. Para isso, o clube contratou jogadores de diversos clubes grandes de São Paulo e conseguiu ganhar o campeonato mineiro daquele ano. Nessa época, o clube trazia vários times para jogarem contra a gente. Jogamos contra o Atlético Mineiro, contra o Cruzeiro e também contra o Santos.

Quanto foi o Placar?

Foi dois a dois.

O senhor tomou gol do Pelé?

O Pelé, nesse jogo, não veio. O Santos veio completo, mas sem o Pelé. O Santos estava precisando de goleiro naquela época. Foi em 68. Eles tinham o goleiro Cláudio que estava com Câncer e, por isso, me chamaram para participar do time, mas eu achei que era muito pra mim e não aceitei. Quando saí do Pouso Alegre eu fui para o Cruzeiro mas não joguei, fui ao Atlético e não joguei também, no Bragantino a mesma coisa. Eu ia e voltava. Ficava um ou dois dias e chegava à conclusão de que aquilo não era pra mim. Então eu voltei a jogar aqui na região e joguei contra muitos goleiros da época. Joguei contra o Barbosa, contra o Laércio, contra o Raul. Um fato interessante é que, em um dos jogos que fizemos no Pouso Alegre contra um time que veio nos desafiar, o placar foi 38 a 0 pra nós. Foi um recorde mundial para a época!
Daquele tempo, algo que eu gostaria que ficasse gravado e que eu gosto muito de recordar, foram as amizades que eu fiz. Os melhores amigos que eu tenho hoje são da época em que eu jogava futebol. O reconhecimento das pessoas é muito gratificante e eu fico muito satisfeito com isso.

Gostaria de falar agora um pouco sobre sua paixão por filmagens. Quando o senhor começou a filmar e fotografar?

Filmagem foi a vida inteira. Quando era criança eu já desmanchava lâmpadas para projetar na parede figuras paradas. Com o tempo, eu vim para Santa Rita e meu pai comprou um projetor. Montei um cinema lá na rua nova! No meu cinema tinha só três filmes: um do Tarzan e dois desenhos animados. Como não tinha televisão na época, isso foi em 67, todo o dia o cinema ficava cheio para assistirem ao mesmo filme. Eu sempre gostei. Com o surgimento da televisão, compramos um dos primeiros aparelhos da cidade e todo mundo ia à minha casa assistir. Alguns anos depois, 25 anos atrás, eu comprei uma câmera e comecei a filmar. Só que eu não filmava como profissional e aquilo começou a me atrapalhar porque eu não tinha mais final de semana. Cada semana era um amigo meu que chegava pra pedir alguma gravação. Aí decidi começar a cobrar para não perder os sábados, mas a procura só aumentou.

A agenda do senhor deve ser bem lotada.

É sim... Inclusive eu agendei um casamento hoje que vai acontecer em abril do ano que vem.

Qual foi o evento mais absurdo que o senhor já presenciou?

Outro dia chegou uma moça que eu já tinha filmado o casamento dela, alguns meses depois, e falou que ficava com a fita mas que eu deveria substituir a cara do noivo no vídeo porque ela já tinha arrumado outro. Ela queria que eu tirasse o noivo daquele casamento para colocar o noivo atual para não perder a fita! (risos)
Outro acontecimento que eu gravei e que marcou muito foi a enchente de 2000. Também filmei uma vaca que caiu na piscina. O filme que eu mais vendo é um que eu fiz só com os personagens folclóricos da cidade. Esse é o que mais sai. Tem o João Onça, o Roselito. Eu gravei todos eles.
É verdade que, em uma das filmagens, o noivo perdeu a aliança no altar?

Eu fui filmar um dos primeiros casamentos da minha carreira e, em determinado momento, o padre pediu as alianças. Cadê as alianças? O noivo fazia gestos pro padre que não sabia onde elas estavam. O casamento parou.Todo mundo procurando as alianças, os padrinhos ajudando, até que descobriram que tinha um furinho no bolso e elas tinham caído no forro do paletó. Depois continuou o casamento.

O senhor tem idéia do tamanho do seu acervo?

Devo ter, entre festas, eventos e carnavais, de 700 a 1000 horas de filme. Sempre que a TV vem fazer alguma reportagem eles me procuram.

Como membro ativo dos democráticos o senhor sempre foi imparcial ao filmar os dois blocos?

Eu já ouvi muita reclamação de gente dizendo que eu filmo o Demo mais bonito que o Ride, sabe? Muitas vezes, para evitar esse tipo de coisa, eu chamava meu irmão para fazer a filmagem dos blocos. Ainda assim, eu recebia críticas de gente que ligava pra minha casa e dizia: “O Demo tá muito melhor no filme!”. O mesmo acontecia com o Róssio De Marchi quando ele fotografava. Diziam que ele caprichava mais nas fotos do Ride. Eu preciso vender os filmes. Tenho que caprichar nos dois. Mas eles não acreditam muito não.

Já faz muitos anos que o Democráticos não sai. O senhor acha que um dia voltará a filmar o bloco?

Particularmente, eu não gosto de filmar o Democráticos. Eu gosto mesmo é de participar. Eu acompanho meu pai desde 1957. Posso dizer que é um bloco de tradição. Quando o carnaval mudou para avenida eu fui representar os Democráticos e avisei o prefeito que aquilo não ia dar certo. Eu disse que o pessoal mais antigo não ia querer ver. Foi justamente o que aconteceu. Tivemos uma experiência muito ruim com o “Bloco de Gala” lá na Avenida e ninguém quis mexer mais. Você não consegue convencer o senhor Hugo e esse pessoal mais antigo que o carnaval é lá. Pra eles é tradição. É história. É o que nós queremos aqui. Aqui de cima eu quero que saia. Eu quero ver o morro iluminado. Eu quero ver o pessoal no cordão e aquelas casas todas com bandeiras, coisas que eu não vejo lá. Tem gente que prefere na avenida, mas acho que eles não devem ter a paixão que a gente tem. Porque quem é apaixonado pelo bloco não fica esperando dinheiro da prefeitura. Este ano o pessoal já está trabalhando. Eu acredito que o bloco vai sair no ano que vem, não sei se será aqui ou lá, mas trabalhando já está.

Para finalizar, o senhor pulou de Asa Delta lá do morro do Esguicho?

Não! Eu não pulei de Asa Delta! (risos) Chegou um circo na cidade uma vez e deixaram uma lona no terreno quando foram embora. Daí pegamos a lona e levamos para a rua nova. Naquela época eu nem conhecia Asa Delta, daí eu fiz uma espécie de pipa gigante para pular lá do morro. Era uma pipa gigante com lona de circo! O baque foi meio grande, sabe? A pipa empinou e eu caí de costas! A minha sorte é que a terra era mais fofa por causa das construções que haviam no local e eu estou vivo!

Um comentário:

  1. otima entrevista vcs deviam publicar mais coisas assim porque isso e nossa historia, gente nossa que brilhou e ninguem sabe, parabens pela publicaçao
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