segunda-feira, 11 de maio de 2015

Tudo culpa do meu avô (Por Carlos Romero Carneiro)

Acreditaria se eu dissesse que você só está aí, fazendo o que está fazendo, por causa do meu avô? Pois é a mais pura verdade. Pode parecer que a intenção seja discorrer sobre a teoria do caos que prevê que, se um mosquito der um passeio pelo bairro Maristela, pode transmitir dengue para cinquenta e duas pessoas e provocar um terremoto no Nepal... mas não. A história passa longe e me dá argumentos suficientes para dizer que o senhor Antônio Lemos Carneiro, nascido no início do século e falecido em noventa, acaba de influenciar a sua vida.
Há exatos vinte e cinco anos e dois meses, o Democráticos não contaria com o seu rival, para contornar a praça. O bloco havia se preparado durante o ano inteiro para descer o morro, mas sofreu um terrível golpe: chovia canivetes naquela terça de carnaval. 

Meu avô, então com setenta e oito anos, acompanhou a agremiação nos cordões e tomou uma tempestade que o botou de cama, devido a uma grave pneumonia que o levaria à morte.

Fiquei chateado pra caramba. Aos doze anos, nunca havia perdido um parente próximo e adorava ouvir as suas histórias. Desapontado, comecei a vasculhar a casa da minha avó em busca de fotografias, documentos e jornais que me ajudassem a conhecê-lo melhor. Através daquela expedição arqueológica caseira, encontrei documentos e fotografias dos tempos em que ele participou da revolução de trinta e dois, além de recortes sobre sua passagem pela Lira Santa Rita, pelos templos da Maçonaria ou pela extinta Companhia Sul Mineira de Eletricidade. Mais do que registros pessoais, resgatei dezenas de jornais antigos, sem saber que aquelas folhas amareladas, seriam muito úteis, duas décadas depois.

Da admiração por aqueles documentos, tive a ideia de criar um jornalzinho sobre a minha turma no “Grupão”. Naquele mesmo ano, me transferi para o Sinhá Moreira, a brincadeira evoluiu e alunos de outras turmas começaram a disputar uma arcaica página mimeografada que mesclava acontecimentos sociais com histórias da instituição. Quando vi que a coisa funcionava, me ofereci para trabalhar em um jornal da cidade e passei a produzir textos que compunham as suas edições semanais. Tudo levava a crer que aquela seria a minha profissão mas, não me lembro o motivo, tentei escapar de todas as maneiras.

Nos anos seguintes, me matriculei na ETE, estudei em Ribeirão e parecia que aquele sonho tinha ficado para trás. Após a faculdade, fui contratado como redator em uma agência e, mesmo que nadasse contra a correnteza, me sentia fadado a escrever. 

Em 2006, já em Santa Rita, abri uma agência de publicidade e a nossa empresa participou de uma licitação para a produção de um jornal. Como a tecnologia já havia aposentado o mimeógrafo, precisei me reciclar e corri à banca do Caruso para comprar um livrinho que ensinasse a diagramar.

Do episódio em que, por necessidade, me ofereci para prestar um serviço sem a menor experiência, até criarmos o Empório de Notícias foi um pulo. Na semana em que o jornal começou a ser vendido, montamos uma tenda em frente à Matriz, na esperança de que alguém comprasse um exemplar. Se não me falha a memória, a única pessoa que se aproximou foi um homem que, ao tomar conhecimento de que o jornal custava apenas um real, nos brindou com a pérola: “Você estão vendendo papel, mano?”. 

Lá se foram quase oito anos e cerca de quatrocentas reportagens. Dos textos que produzimos ou resgatamos, selecionei oitenta e três matérias para compor o primeiro volume de uma obra intitulada “Almanaque Cultural Santa-ritense”, que chega às bancas, no dia 20 de maio, com mais da metade da primeira edição vendida com ante-cedência. 

Depois de tantas voltas, talvez você acredite que o meu avô tenha influenciado a sua vida de alguma forma. Afinal, se ele não tivesse falecido por absoluta falta de juízo, eu não teria produzido este texto e você, consequentemente, não estaria com o Empório nas mãos. Tudo culpa do meu avô.

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Um comentário:

  1. Ótimo texto. Por culpa sua eu ando detesto ouvir ganço, mas essa é outra estória...

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