quinta-feira, 5 de junho de 2014

O tempo econômico e o tempo político (Por Salatiel Correia)

Aquele foi um dia festivo no Inatel. O recinto onde aconteceria a solenidade se encontrava repleto de professores, funcionários, estudantes e políticos. A figura central daquele acontecimento era o então Vice-presidente da República, Aureliano Chaves. Este visitava a escola para inaugurar o auditório com seu nome.
Sinhá, Luís Gomes, Bilac e Carminha Moreira.
Figura imponente, física, política e moralmente, Aureliano ocupava o centro na composição da mesa. Uma mesa repleta do poder político da região. À direita do ex-governador das Gerais, com seus cabelos embranquecidos, sentava-se o ministro Olavo Bilac Pinto, acompanhado do seu filho, o deputado Federal Francisco. À esquerda do ex-presidente, encontrava-se o então diretor do Inatel Luís Gomes da Silva Júnior.

Aureliano, bom orador, mostrou, em seu discurso, intimidade com a região. Ainda retenho na memória sua entusiasmada saudação à família Bilac Pinto, especialmente à cunhada do ministro Olavo: Sinhá Moreira. O que mais fez Aureliano naquele dia foi ressaltar, com muita justiça, os feitos da maior benemérita da região.

Aquele acontecimento, visto pela lupa do tempo, representa, com precisão, algo muito presente na Santa Rita anterior ao Vale da Eletrônica: o sincronismo entre o tempo econômico e o tempo político. Tanto um como o outro tinha a mesma velocidade.

As pioneiras lutas de dona Sinhá Moreira em prol de levar uma escola de eletrônica para a cidade e as lutas da sociedade santa-ritense no sentido de instalar o Inatel na cidade evidenciam o sincronismo entre a política e a economia na terra de Delfim Moreira. 

A política e a economia, de mãos dadas, trouxeram escolas que criaram a ambiência necessária para que eclodisse algo que, a partir dos anos de 1980, descolou o tempo econômico do tempo político: o Vale da Eletrônica. Certamente, a eclosão do Vale da Eletrônica e suas indústrias deram uma nova dinâmica à economia da região. A política. simplesmente. não conseguiu acompanhar tal dinâmica.

Percebo, claramente, essa cisão ao visitar com certa frequência o site do Inatel. O que se desenvolve no mundo do campus se encontra perfeitamente conectado com uma nova ordem imposta por um mundo que se globaliza cada vez mais. Inovação, internacionalização e empreendedorismo são valores inerentes a esse mundo. Empresas como a Leucotron, o hospital Maria Thereza Rennó e as dezenas de indústrias do Vale da Eletrônica também vivem essa dinâmica.

Infelizmente, o tempo político não consegue acompanhar essa nova realidade. Basta observar o site do compromissado Giácomo Costanti, o Vale Independente, para perceber os déficits infraestruturais da cidade. A inexistência de uma infraestrutura hoteleira condizente com essa nova ordem que vive o tempo econômico do inovador Vale da Eletrônica é outro indicador que se observa.

Mas isso não ocorre apenas em Santa Rita. O Brasil inteiro vive esse descompasso entre o tempo econômico e o tempo político. Um bom exemplo é o centro-oeste brasileiro e, mais ao norte, o estado do Tocantins. Nessa região, o que desconecta o tempo econômico do político é outra forma de geração de riqueza: o agronegócio.

O Produto Interno Bruto cresce, apesar dos governos. A dinâmica da soja para exportação é quem dita os rumos que infraestruturas como o asfalto e a energia elétrica devem seguir. A ferrovia norte-sul nada mais é do que o braço infraestrutural que atenderá ao escoamento da soja para mercados distantes como a China.

Nada mais adequado para encerrar estes escritos do que os versos de nosso poeta maior, Carlos Drummond de Andrade, a respeito do tempo numa cidade interior: “onde homem vai devagar. Um cachorro vai devagar. Um burro vai devagar. Devagar as janelas olham”. Este tempo convive, hoje, no mesmo espaço geográfico que o espírito empreendedor dos Bill Gates da pós-modernidade, onde o tempo econômico é um; e o político, outro.

Salatiel Correia é Engenheiro, Administrador de Empresas, Mestre em Planejamento Energético. É autor, entre outras obras, de A Energia na Região do Agronegócio.

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