quarta-feira, 27 de novembro de 2013

"A inovação só vai ocorrer na hora em que as pessoas conhecerem diversos aspectos da vida humana".

O PE-ET - Polo de Excelência de Eletrônica e Telecomunicações entrevistou neste mês de novembro o professor Wander Wilson Chaves, vice-prefeito municipal de Santa Rita do Sapucaí (MG), o Vale da Eletrônica, e secretário municipal de ciência e tecnologia, indústria e comércio. Wander falou sobre o programa "Cidade Criativa Cidade Feliz", ocorrido semana passada. Ex-aluno da ETE-FMC - Escola Técnica de Eletrônica Francisco Moreira da Costa e ex-aluno e diretor do Inatel - Instituto Nacional de Telecomunicações, Wander foi um dos organizadores do programa. Ele falou sobre as expectativas deste projeto (a entrevista foi concedida antes do evento), sobre a interação entre ciência e as artes e do que é possível fazer para a qualidade de vida de todo e qualquer cidadão.


PE-ET - De onde ou de quem surgiu a iniciativa do programa "Cidade Criativa Cidade Feliz"? A que demanda (e qual o volume dela) ele responde?

Wander Wilson Chaves - Nós reunimos em torno de 15 instituições de nossa cidade, de forma representativa seria o poder público e a sociedade civil organizada, para um desenvolvimento com qualidade de vida para nossa cidade. Este evento, depois de discussão, diálogo, debate e de reflexões, optamos por um evento que estamos denominando Festival de Criatividade e Inovação porque é algo muito peculiar no ponto de vista de sinalizar o desenvolvimento que as cidades do mundo hoje precisam ter, não só Santa Rita. Essa demanda ela advém de que, no caso de Santa Rita do Sapucaí, nós temos uma competência muito grande estruturada no aspecto da agropecuária, no aspecto da educação particularmente tecnológica, no aspecto da cultura, no aspecto da ciência e da tecnologia. Ao propor um evento desta natureza, poderemos dar o primeiro passo para caminhar em direção a um movimento existente chamado "cidade criativa".

PE-ET - Crítica recorrente é de que o Vale da Eletrônica aspira tecnologia, inovação, vanguarda, em detrimento às manifestações artísticas/culturais. A ciência subjuga a arte em Santa Rita do Sapucaí?

Wander - Na realidade elas trabalham de forma isolada e no mundo de hoje, o mundo contemporâneo, é necessário unir estas duas coisas. Os conceitos de cidade criativa que existem no mundo hoje, os principais conceitos, são dois. O conceito americano trabalha as cidades fortemente baseado em cidade tecnológica, em talento (portanto, a educação é peça fundamental) e tolerância. Porque numa cidade você reúne pessoas com diversos interesses e se você não tiver este equilíbrio, este respeito entre elas, fica complicada a sobrevivência num espaço curto com tantas pessoas assim. Já o conceito europeu, que me agrada mais, trabalha três pilares de desenvolvimento que são a cultura, a conexão (conexão no sentido de dialogar diversas culturas para eventualmente criar uma nova cultura adequada ao mundo contemporâneo, à sobrevivência e a qualidade de vida dos munícipes) e a inovação. Não existe separação entre as coisas mais. Aliás, mesmo no campo da ciência e da tecnologia, em qualquer área, a inovação só vai ocorrer na hora em que as pessoas conhecerem diversos aspectos da vida humana. É isso que vai desenvolver nas pessoas a capacidade de imaginar e de criar coisas novas. Então, a proposta é fortalecer todas as áreas e fazer uma conexão para que exista uma inovação e por conseguinte, além de resolver problemas da cidade, ao mesmo tempo possamos criar um movimento de desenvolvimento mais adequado para o momento que vivemos hoje.

PE-ET - "Cidade Criativa Cidade Feliz" é um programa com agenda ampla e que procura atender diferentes expectativas. A ideia deste grande evento propõe remodelar o calendário de eventos da cidade, até então com datas pontuais e desarticuladas?

Wander - Ele não tem a pretensão de simplesmente coibir as manifestações individuais. Pelo contrário, quando mais manifestações individuais tivermos melhor, no campo da ciência, no campo da cultura, no campo da educação. Mas ele propõe ser um momento onde possamos unir estas áreas todas, refletir, debater e criar caminhos diferenciados para o desenvolvimento da cidade.

PE-ET - Pela primeira vez o poder público constituído, instituições privadas e lideranças de Santa Rita do Sapucaí se articulam em conjunto para oferecer à sociedade sua gama de experiências e aprendizado. Finalmente chegou-se a um bom termo de que o bem estar social e a qualidade de vida no município são responsabilidades de todos?

Wander - Bom, eu não sei se é a primeira vez. O movimento do Vale da Eletrônica teve uma participação muito forte entre o meio acadêmico, o meio empresarial e o poder público à época - nosso saudoso prefeito Paulo Frederico Toledo - foi um momento de união [meados da década de 1980]. De lá para cá, cada um tomou, embora a união exista, sua energia naquilo que precisa ser feito e de fato este é um momento onde fica claro, absolutamente claro, que se não tivermos um arranjo de cooperação entre a sociedade civil e o poder público, fica muito difícil propormos soluções inovadoras e criativas para resolver os problemas da cidade. Mas, mais do que isso, fica difícil você saber que caminho trilhar para o futuro num mundo contemporâneo extremamente competitivo com desafios jamais enfrentados na história da humanidade. O cuidar da cidade é responsabilidade de todos sim. Não é só o poder público ou a sociedade civil. É necessário ter esta compreensão de que cuidar da cidade, em diversos aspectos, é preciso este arranjo de cooperação.

PE-ET - Que resultados práticos são aguardados após a primeira edição do "Cidade Criativa Cidade Feliz"?

Wander - Nós pretendemos realizar um projeto, registrar o que aconteceu. Este projeto será a base para um evento ainda mais qualificado para 2014. Nós já temos uma equipe que vai acompanhar e registrar todos os eventos, construir um projeto para que possamos levar aos órgãos governamentais (governos do Estado e Federal) e poder realizar um evento que inicie no ano que vem em âmbito regional, mas pensando lá na frente em ser um evento internacional. Um outro desdobramento importante é que nós vamos ter momentos de debates, momentos de palestras, que com certeza as pessoas que participarem, os segmentos que participarem, sairão com ideias novas, propostas novas e reflexões novas. Acho que assim cumpriremos nossos objetivos.

PE-ET - Santos Dumont teve que apresentar seu experimento científico, o 14 Bis, numa feira de artes. Sob o argumento de que "não havia mais nada para se inventar", o departamento de patentes norte-americano fechou suas portas. Na virada do Século XIX, a ciência teve pouco ou nenhum apoio; as artes estavam em efusão. Hoje, a relação se inverteu. A corrida pela inovação, produção de papers e registro de patentes virou uma obsessão dos países em desenvolvimento e o apoio às artes ficou em segundo plano. Com o Sr. avalia a questão? É possível dialogar ciência com arte?

Wander - Acho necessário dialogar ciência com arte. Entende-se que existem hoje quatro pilares de desenvolvimento de nossa cidade que são absolutamente necessários sob pena de ficarmos fora do contexto contemporâneo. O primeiro é a ciência e a tecnologia. Se você não tem o domínio delas estará excluído do processo de desenvolvimento no mundo contemporâneo. É fundamental de que você tenha a valorização, o domínio e o incentivo á ciência e por consequente à tecnologia. O segundo ponto é o empreendedorismo, que é a mola propulsora para que as pessoas sonhem, realizem, progridam, inovem. A ciência e a tecnologia com o empreendedorismo dão conta de uma sobrevivência no mundo contemporâneo, de uma ação no mundo contemporâneo, que pode até momentaneamente levar ao sucesso com resultados financeiros. Porém, existe na turbulência deste mundo contemporâneo mais duas necessidades absolutas. A cultura, onde a arte é o principal vetor, que desenvolve a conscientização - não deixa as pessoas alienadas. Humaniza as pessoas - aliás tem um definição de cultura do Papa João Paulo II que dizia o seguinte: "O que é cultura? É tudo aquilo que o homem cria que transforma o homem em mais homem". Trata-se de um processo de humanização. Então, nesse sentido, tecnologia e artes elas se confundem, é uma coisa só, não existe separação. Por fim a ética e a cidadania. Ética no sentido de que precisamos através de um trabalho de educação dotar as pessoas de valores que façam com que elas decidam entre o bem e o mal, entre o vício e a virtude. A cidadania é para aquela pessoa que, ao tomar uma ação, ela entenda que esta ação deva se refletir num bem coletivo. Com estes quatro pilares, acreditamos que as cidades podem se desenvolver de forma harmônica, progredir, mas com qualidade de vida. Enfim, o principal são as pessoas. Estes quatro pilares têm de fazer parte de um processo de desenvolvimento de qualquer comunidade. 

Entrevista e foto: Evandro Carvalho/PE-ET.

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