segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Aqui viveu Adélia Duarte

 
Filha de João Rodrigues e Lina Cleto Duarte, Adélia Duarte nasceu em Bela Vista no dia 20 de julho de 1900 e veio para Santa Rita ainda moça para se alfabetizar. Com apenas quinze anos, Adélia casou-se com Mário Palma e teve sua primeira filha, Almehy, um ano depois. Era uma família feliz. Os três moravam em uma casa em frente à Estamparia até que, pouco depois de completar 17 anos, Adélia ficou viúva e foi obrigada a encarar a vida sem a proteção do marido.
Um novo começo

Passados dez anos, Adélia resolveu se casar novamente. A linda moça não tardou a despertar o amor de um músico chamado Pedrinho Dias, que se tornou seu companheiro. Mais uma vez amparada por uma companhia, Adélia teve a chance de ser feliz novamente.
Um fato inacreditável

No período de um ano, um fato incrível passou a acontecer na vida do casal. A moça tinha sonhos constantes com números. Ao acordar, ela contava a Pedrinho o seu sonho e ele tratava de sair à procura de bilhetes de loteria com tais dígitos. Sempre que encontrava os bilhetes, ele comprava a cartela toda e aguardava o resultado. O mais inacreditável foi que, em poucos meses, o casal acertou na loteria federal 3 vezes seguidas. Juntos, faturaram 300 mil Réis, uma fortuna para a época e se tornaram muito ricos. Com a bolada que receberam, Pedrinho e Adélia puderam realizar um grande sonho: comprar uma das mais bonitas casas de Santa Rita.
A casa

Ninguém sabe ao certo porque  o Senhor Machado, um reconhecido construtor responsável por algumas das mais belas residências que Santa Rita já teve, resolveu ir embora da cidade. Algumas pessoas da época dizem que ele teve um desgosto tão grande que resolveu vender sua residência com todos os móveis dentro. O comprador foi Pedrinho, que mudou imediatamente com sua esposa para a casa que sempre sonharam.

A residência possuía uma arquitetura lindíssima. Os móveis, todos da melhor qualidade, compunham o ambiente e davam um ar ainda mais elegante à fina residência. Já no quintal, 37 jabuticabeiras e três mangueiras ofereciam um charme ainda maior à acolhedora morada. O amplo terreno, que fazia divisa com o seminário era sempre ocupado pelos alunos que usavam o imenso jatobá ao lado da cerca como escada para suas invasões.
Novamente sozinha

Tudo corria às mil maravilhas até que, pouco tempo depois de mudarem para a nova residência, uma tragédia interrompeu aquela história de amor. Um ano depois de se casarem, Pedrinho morreu deixando Adélia com apenas 28 anos e viúva pela segunda vez.
Como Pedrinho tinha uma família numerosa e três irmãs solteiras que viviam de crochê, Adélia decidiu abrir mão de sua fortuna e comprar uma casa para cada uma delas. Da renda obtida no jogo, a jovem senhora investiu no amor que nutria pela família do marido e ficou apenas com a casa localizada na Avenida Delfim Moreira.
A prática da caridade

Desde então, Adélia passou a praticar a caridade e ajudou muitas pessoas carentes. Incontáveis eram os necessitados que recebiam o conforto material e espiritual de que tanto precisavam.
José Sustenido

Na segunda metade da década de 30, José “Sustenido”, irmão de Pedrinho, foi mais um beneficiado com a generosidade dessa grande senhora. Por muitos anos, utilizou o Porão de Adélia Duarte como gabinete dentário, onde recebia diversos pacientes, todos os dias.
A revolução de 32

Conta-se que, durante a Revolução de 1932, quando os paulistas marcharam em direção ao sul de Minas, poucas foram as pessoas que ficaram na cidade. O medo de um ataque iminente fez com que grande parte dos santarritenses debandasse para a zona rural em busca de abrigo. Dos que ficaram, Monsenhor Calazans e Adélia Duarte ajudaram a acalmar os conterrâneos.
Os visitantes

Por ser muito receptiva, inúmeros eram os visitantes que a procuravam em sua residência. Dentre todas as pessoas que iam até à sua majestosa  casa diariamente para tomar um café e conversar sobre a vida, dois deles Adélia reconhecia pela maneira peculiar com que tocavam o sininho ao lado portão: Chiquinho Carteiro e Daltinho Dias.

No final dos anos 50, Adélia acolheu em sua casa sua irmã que se tornara viúva e um afilhado. Desde então, a nova moradora da casa, Dalila Duarte, passou a utilizar o porão da residência como ateliê e tornou-se muito conhecida pelos lindos vestidos de noiva que criava. Não se sabe ao certo quantos bouquets foram feitos com o lindo pé de camélia plantado na entrada daquela acolhedora casa. A costureira e seu filho moraram com Adélia por mais de 10 anos.
A festa de 1957

Em 1957, Dona Sinhá Moreira realizou a mais bonita Festa de Santa Rita de que se tem notícia. Para ajudar a amiga festeira, Adélia logo ofereceu sua casa para que fossem preparados os cartuchos e doces. Grande parte das guloseimas servidas aos visitantes durante aquela festa  inesquecível foi feita por Adélia e por sua sobrinha Ritinha Duarte.
O término de uma existência

Em 1966, Adélia foi acometida por um terrível câncer no colo do útero. Como naquela época o tratamento ainda era muito precário, no dia 27 de setembro de 1968 a benevolente senhora foi vencida pela enfermidade. Chegava ao fim uma trajetória de lutas, em uma vida marcada por inumeráveis exemplos de caridade e resignação.
Os novos moradores

Com a morte da querida Adélia, sua casa ficou fechada por mais de um ano. Naquele período, alguns moradores tinham medo de passar por ela. Em 1969, Almehy e seu marido, José Estulano Cruz Filho, herdeiros da residência, realizaram uma pequena reforma e se mudaram para lá.

No ano de 1975, José Estulano abriu uma pequena rua ao lado da casa, loteou e, em homenagem à querida senhorinha que ali residiu, colocou o nome do lugar de Vila Adélia, que hoje possui cerca de 10 residências.
 
Atualmente, quem vive na imponente morada é o neto de Adélia, Robinson Cruz, que retornou à residência para cuidar dos pais. Desde então, no mesmo porão onde noivas ganharam lindos vestidos e onde José Sustenido tratava de seus pacientes, Robinson montou seu consultório de estética.

Em 2000, ano em que Adélia completaria 100 anos, Robinson realizou uma bonita homenagem a avó, ao plantar novamente todas as flores que existiam no jardim enquanto ela ainda era viva. A mistura de cores exuberantes trouxe vida ao rico canteiro e ajudou a adornar ainda mais aquela residência onde viveram tantos sonhos,  lutas e desafios. 

(Texto baseado nos depoimentos de Robinson Cruz e Elisa de Melo Pereira)

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