segunda-feira, 30 de maio de 2011

O talento genial de Sérgio Augusto Bertoloni

Sérgio Augusto Bertoloni nasceu há 200 quilômetros de Santa Rita do Sapucaí, em Conceição de Aparecida, e cresceu apaixonado por música. Aos oito anos, junto com 4 amigos, formou uma banda de bate-lata que fazia um grande sucesso entre a molecada. De garrafas de conhaque Presidente amarradas com barbante pelo gargalo, foi criada uma marimba. Com barricas redondas de sabão - cobertas com sobras de couro da fanfarra da escola - foram feitos instrumentos de percussão. A guitarra surgiu de um pedaço de madeira recortada, acordoada com linhas de anzol. Não faltava mais nada. Aquilo era tudo o que eles precisavam para tocar o terror nas festinhas da escola. Na verdade, ninguém sabia tocar nada. O grupo seguia mais o ritmo do que a harmonia.  No entanto, o sucesso foi tamanho que a nova banda passou a cobrar 3 palitos de fósforo (uma fortuna na época) para a criançada assistir aos ensaios. Aquela encenação toda acabou chamando a atenção de Heraldo - um eletricista da pequena cidade de 8 mil habitantes - que ofereceu aos garotos um microfone velho de presente. Com a valiosa peça em mãos, eles precisavam agora de um bom amplificador. Muito fácil: com uma caixa de banha, Serginho consertou um rádio velho doado pelo tio, conectou o microfone ao potenciômetro e colocou para funcionar sua mais recente invenção. Mais tarde, acabaram surgindo novas geringonças – feitas com sobras de material de construção. A mais curiosa foi a iluminação de palco, feita com restos de fios e lâmpadas, amarrados em um cabo de vassoura. Em meio a toda aquela diversão, Serginho mal sabia que com seu grande interesse por válvulas, fios e lâmpadas, estava empreendendo os primeiros passos no que viria a fazer pelas próximas décadas.

Na adolescência, as brincadeiras foram substituídas por um pequeno laboratório de química, por revistas de eletrônica e pela leitura de obras clássicas na biblioteca municipal. Enquanto a turma jogava no campinho, Serginho estava em outra e passava horas ouvindo a bibliotecária contar como foi a estada de Platão no purgatório de Dante Alighieri. 

Em 1976, o rapaz ficou sabendo que um de seus conterrâneos tinha acabado de se matricular na mais famosa escola de eletrônica do país. Aquilo despertou nele uma vontade enorme de aprender a profissão e Santa Rita do Sapucaí acabava de entrar nos seus planos.
Em 1980, o segundo estudante de Conceição de Aparecida pousava na terra do João Onça e se matriculava na ETE, depois de concluir um mês de cursinho com o professor Melqui. Após a formatura, três anos depois, Serginho buscou novos ares e passou algum tempo em São Paulo antes de cursar o Inatel, em 1986. Desde então, o rapaz começou a trabalhar na Sense e nunca mais saiu. Ele fazia o que mais gostava, mas com o passar dos anos, o peso da responsabilidade começou a pesar em seus ombros.  O alto nível de estresse acabou levando-o a fazer uma consulta médica para saber como reduzir a pressão que já alcançava a estratosfera. A sábia sugestão do médico foi a de que ele desempenhasse alguma tarefa que lhe proporcionasse prazer e utilizasse seu tempo livre para desanuviar a mente. A coincidência foi que, naquele período, seu filho havia acabado de iniciar suas aulas de música e aquilo inspirou uma velha habilidade em Serginho que pensou: “Vou construir uma guitarra para o Luiz Fernando!”

Desta vez seria diferente. Serginho já era engenheiro e tinha conquistado grandes conhecimentos de tecnologia. No começo, não tinha a técnica necessária ao Luthier (nome dado ao construtor de guitarras), mas disposição era o que não faltava. Tratou de comprar livros, procurar grandes profissionais da área e encontrar formas de realizar seu sonho: produzir uma das guitarras mais cobiçadas do planeta. 

O primeiro trabalho do engenheiro não foi humilde. Construiu uma Fender Broadcaster de primeira linha. Com um pedaço de mogno imperial (árvore extinta no Brasil no século XIX), delineou perfeitamente o corpo do instrumento. O braço foi feito com madeira marfim. Para a blindagem da guitarra, usou tinta condutiva, criando um sistema mais perfeito do que o modelo original. As cores escolhidas foram os matizes da moda nos anos 50: Azul e Preta. Com cerca de 1500 Reais, criou um instrumento que, em uma loja, não custaria menos de 9000. Sua missão estava cumprida.

Assim que terminou a construção de seu primeiro trabalho, Serginho o levou para fazer a afinação em São Paulo. Naquele mesmo dia, Kiko Loureiro, guitarrista do Angra – uma das bandas brasileiras mais conhecidas do mundo – estava passando pelo local e viu o raro instrumento. Ao tocar algumas músicas naquela Broadcaster artesanal, o grande guitarrista ficou encantado com a sua qualidade e disse que o engenheiro tinha feito um excelente trabalho. Era a pilha de que Serginho precisava para levar seu hobbie à frente.
As guitarras seguintes, construídas em cerca de um ano e meio cada uma, se inspiraram em uma evolução de Leo Fender: a Telecaster. A primeira era branca, com pinturas feitas por sua filha Giovana que sobrepunham o corpo e o braço do instrumento. Quando finalizou a construção da relíquia, a peça foi presenteada ao professor de guitarra de Luiz Fernando – o famoso guitarrista Giovani - que foi às lágrimas quando soube que havia sido feita especialmente para ele. A segunda obra foi toda recoberta com imagens da “Divina Comédia”, através de uma técnica sugerida por Giovana, e que teve um trecho da obra gravado atrás do instrumento. Uma preciosidade. Quem conhece o assunto diz que poucos exemplares conseguiram um desempenho tão perfeito. Desde então, a notícia correu o mundo da música e guitarras das mais diversas procedências começaram a chover no quintal do novo luthier para serem aperfeiçoadas através de sua incrível técnica. De lá pra cá, mais de 50 instrumentos passaram por suas mãos, mas ele nunca cobrou um único real pelo serviço.

O desafio seguinte foi muito além da construção de guitarras. Serginho estava à procura do amplificador perfeito e criou uma joia valvulada de alta potência, toda recoberta de mogno. O sonho de todo artista. Para finalizar seu feito, gravou em uma lâmina de aço sua assinatura – Bertoloni – e aplicou no equipamento.

A arte do engenheiro não tem hora para acabar. O próximo trabalho de Sérgio Augusto Bertoloni será uma “Slide Guitar”. Seu filho, que hoje é guitarrista de uma banda que tem apresentado o projeto “Pink Floyd Experience”, não vê a hora de o instrumento ficar pronto para dar um gás ainda maior em suas apresentações. Enquanto isso, pai e filho, tornam-se cada vez mais unidos pelo amor em família e pela paixão pela música, traçando novos projetos em nome do bom e velho Rock and Roll.

(Carlos Romero Carneiro)

Um comentário:

  1. QUE HISTORIA LINDA ! MOREI EM SANTA RITA , TINHA MUITA VONTADE DE ESTUDAR ELETRONICA NA ETE , MAS POR PROBLEMAS PESSOAIS TIVE QUE VOLTAR A MINHA CIDADE E AQUI ESTOU JA A 12 ANOS , MEU DEUS QUE SAUDADE DE SANTA RITA DO SAPUCAI E DOS AMIGOS QUE LA DEIXEI !

    ResponderExcluir