Embora tenham eles atuado empresarialmente em épocas muito distanciadas uma da outra, tem-se a impressão de que a crença de ambos no empreendedorismo com geração de riqueza foi exatamente a mesma.
O primeiro viveu nos tempos do Segundo Reinado, no século dezenove, quando predominava o poder moderador do imperador. O segundo vive os dias atuais do século vinte e um, em cuja realidade impera a volatilidade dos capitais globalizados que se locomovem ante a velocidade das informações. É extraordinário pensar nos feitos daquele menino pobre, órfão de pai, chegando, ainda criança, com nove anos, ao Rio de Janeiro para trabalhar como caixa de um armazém, por mais de 15 horas, em troca de casa e comida.
A falência desse estabelecimento levou nosso personagem a mudar de emprego. Foi indicado, no distante ano de 1830, para trabalhar na empresa de importação do escocês Richard Carruther. Aprendeu tudo com ele: das técnicas de contabilidade e planejamento a falar inglês.
Conheceu a Inglaterra, berço do capitalismo mais avançado do mundo, onde se gestou a Revolução Industrial. Ao retornar ao Brasil, lutando contra uma mentalidade escravocrata e rural, iniciou seu império industrial. Veja-se alguns de seus feitos: implantação da primeira ferrovia brasileira, a estrada de ferro do Rio de Janeiro. Pioneiro na exploração do rio Amazonas e afluentes, bem como no Rio Grande do Sul, em barcos a vapor, a iluminação pública a gás do Rio de Janeiro, a criação do primeiro Banco do Brasil e a instalação do cabo submarino entre a América do Sul e Europa.
No auge de seu império, controlava 17 empresas localizadas em seis países (Brasil, Uruguai, Argentina, Inglaterra, França e Estados Unidos). Sua fortuna, em 1867, de 115 mil contos de réis, ultrapassava o orçamento do próprio Império, de 97 mil contos de réis.
Detalhe: se atualizarmos a fortuna desse empreendedor para os dias de hoje, chegaremos à espantosa cifra de 60 bilhões de dólares. Tratava-se de um verdadeiro Bill Gates do Império.
Falemos agora do segundo empreendedor. Abandonou o curso de engenharia metalúrgica, na Alemanha, com o intuito de se tornar um homem rico no Brasil. Sonho sonhado, iniciou sua trajetória comercializando ouro de uma pequena mina de sua propriedade para os centros mais dinâmicos do país e, posteriormente, para o exterior. Ganhou dinheiro e montou empreendimentos no Canadá. Faliu.
De volta ao Brasil, concentrou seus negócios no país. A volta por cima veio com a providencial ajuda do capitalismo de Estado brasileiro que sempre irriga de boa vontade quem financia campanhas políticas dos donos do poder. Fomentado pelo BNDES e outras fontes, vieram empreendimentos que revigoraram os negócios de Eike Batista. A termoelétrica do Ceará (conhecida por termoluma, em alusão a então esposa do empresário, Luma de Oliveira). A venda de uma mineradora para a poderosa Anglo, foi outro negócio da China. Detalhe: como não produziu minério suficiente, deu um prejuízo de mais de 4 bilhões de dólares para a empresa britânica, com isso, custando a cabeça da principal executiva do grupo.
Bons negócios foram o combustível que deu origem a inúmeras empresas que se agruparam na sugestiva letra multiplicadora X— OGX (Petróleo), LLX (logística), MMX (mineração), etc. O empreendedor de que vos falo tem um talento inegável para vender riquezas, mesmo que estas ainda não tivessem sido geradas.
Do otimismo exagerado aliado à euforia de um país com PIB crescente contribuíam para a valorização das ações desse empresário. Chegou ele a tornar-se o sétimo homem mais rico do mundo, com fortuna estipulada em 27 bilhões de dólares.
Certamente, ele não teria conseguido acumular tamanha fortuna se a regulação de capitais no Brasil não fosse tão frágil como se mostrou ser. O resultado dessas falhas acumuladas ao capitalismo, de laços em torno das instituições de fomento ao desenvolvimento, levou o mundo X por água abaixo no momento em que as projeções, tão apregoadas empreendedor, mostraram a verdade dos fatos. O petróleo prometido simplesmente não existia. Resultado: a partir daí, o império X desmoronou, assim, começando o inferno astral de seu fundador.
Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, é o primeiro personagem; Eike Batista, o segundo. Ambos com o discurso em torno do empreendedorismo, mas com práticas completamente diferentes um do outro, a começar da origem.
O Barão de Mauá saiu da pobreza. Fez-se absolutamente sozinho. Eike Batista, admita ele ou não, sempre, teve a ajuda do pai nos momentos decisivos (a jornalista Malu Gaspar nos conta detalhadamente esses fatos no livro que escreveu a respeito do mundo X. Leia-se: “Tudo ou Nada”).
Mauá gerou empreendimentos que produziram não só riquezas que impulsionaram a débil economia do Segundo Reinado, mas de grande parte da América do Sul. Eike gerou sonhos em Power Points que capitaneava investidores externos em um período que estes acreditavam na pujança do país. O Barão não contou com as benesses do Estado. Ao contrário: contou, sim, foi com os ciúmes de uma classe rural retrógrada, de uma economia que lucrava com o tráfico de escravos. Além disso, o imperador, um tanto quanto conservador, não comungava do mesmo espírito dinâmico do empreendedor. E, então, quem esteve imbuído do verdadeiro espírito empreendedor - o Barão de Mauá ou Eike Batista? Sem dúvidas, fico com o espírito empreendedor de Irineu Evangelista de Souza. E você?
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